quarta-feira, 22 de julho de 2020

OBSCURO OBJETO DO DESEJO

Atrás
Dos passos
Marcados na areia
Diluem-se

Busco
A captura daquela cena
Decomposta
Pelo tempo

São restos de memória
Meus
Que a terra
Come

O quadro com bordas
De vazio dentro

Escavo a imagem
De seu pertencimento

Toco o fio
Que não posso ver
O que vejo
Me
Escapa

A incessante
Procura
Daquilo
Que nunca
Poderá
Ser
Encontrado

CORRENTE



Meu avô
Moreno, era como o chamavam
Meu avô tinha mania de limpeza
Emprestava seu corpo
Negro
E com as mãos
Esfregava
Os vasos, os vidros, o chão
Queriam dele
Tudo branco
Ele apagava as marcas

Meu pai
Pantera, é como o chamam
Meu pai sempre teve mania de conserto
Para cada convicção enferrujada
Uma ferramenta
Para polir asperezas

Ele desoxida camadas ultrapassadas
Não guarda nada
Faz funcionar

Aos carros emperrados
Rodas que deslizam
Pelas quebradas
Pela monotonia
Pelos concretos da vida

Sua oficina
Uma máquina de potencializar
Presença

Com um aprendi a não remover as memórias
Com outro aprendi  a consertar a afonia

Meu pai é verbo de ligação
Às vezes também me faltam molas
Mas eu não emperro
Porque ele me ensinou
Que quando estou em movimento
Minha palavra é chave